quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Depoimento - Renata Ricardo

Esse é o depoimento de Renata Ricardo, mãe dos gêmeos Antônio e Giovana, atualmente com 1 ano e 3 meses.

Minha gestação, apesar de ser de risco, por ser gemelar, foi tranquilíssima. Ganhei só 15 kg, não inchei, não tive pressão alta, diabetes, enfim, tudo normal. Todas os exames de ultrasom foram normais, sem qualquer alteração. Como minha barriga ficou enorme a obstetra, por ser a minha primeira gestação, acreditou que eu não conseguiria levá-la até 37 semanas e marcou uma consulta para a data que eu completaria 34 semanas. Nessa consulta, marcaria meu parto. Um dia antes, com 33 semanas e 6 dias, minha bolsa estourou e nasceram minhas vidas. Apesar do bom peso para prematuros, ficaram internados por 20 dias (Giovana, por solidariedade ao irmão, diziam as enfermeiras, porque ela não sugava) e Antônio, com uma infecção intestinal. 

Eu, marinheira de primeira viagem, não entendia muita coisa, mas todos os dias perguntava aos médicos plantonistas na UTI se ele havia evacuado e a respostas era sempre "hoje não". Essa resposta durou 15 dias!!! Ou seja, os médicos nem sabiam que ele não evacuava havia 15 dias. Só sabiam que "naquele dia" ele não havia evacuado. Eu comparava com minha outra filha, que já evacuava amarelinho, e os médicos diziam que era normal e que ele ainda ia liberar o mecônio, porque "teve uma infecção". 

Hoje, eu sei que, 95% das crianças que não liberam o mecônio em até 2 dias têm chance de ter aganglionose congênita.

Fomos para casa, após 20 dias, e meu filho ainda liberava mecônio.
Fomos à primeira consulta no pediatra, e me queixei da obstipação persistente do Antônio. Ele foi diagnosticado com refluxo, demos medicamentos para uma doença que ele não possuía. Ele mamava e logo depois vomitava quase tudo, parecendo uma sessão de exorcismo. Ele chorava o tempo todo e os médicos diziam que ele era "chorão". Foram 5 pediatras diferentes. Ah, e as fezes, nossa, as fezes eram fétidas demais, só eu aguentava o mau cheiro delas. Meu filho era um bebê que dificilmente sorria. E só eu não achava nada normal. Meu marido dizia que eu mudava de médico porque estava procurando uma doença que não existia. 

Eu ficava agoniada, pensando por dias que eu era louca, e outros que os médicos eram loucos. Até que aos 7 meses fui, por minha conta, à uma gastroenterologista pediatra, que me recebeu com a seguinte pergunta: "Mãe, por que está aqui?" E eu: "Doutora, porque eu quis. Só eu quis. Eu precisava vir porque já estou enlouquecendo. Eu acho que a constipação do meu filho não é normal. Ele fica roxo para evacuar, suas fezes são fétidas demais, ele vomita constantemente e demorou 15 dias para liberar o mecônio. Os pediatras dizem que a alimentação vai corrigir".

Ela me olhou, ficou meio hesitante, disse que achava que devia ser normal, porque ele não tinha característica de doença intestinal (não tinha abdômen dilatado, porque eu não o deixava um dia sem evacuar, mesmo que os pediatras dissessem que era normal não evacuar por até 3 dias), tinha o peso e altura corretos para a idade dele. 

Fizemos o enema baritado e já saímos de lá ligando para marcar consulta com um cirurgião.
Graças a Deus e aos amigos médicos, conhecemos um anjo chamado Dr. Ivens Baker, que me acalmou e disse: "Seu filho vai ficar bom, só não sabemos se haverá necessidade de colostomia ou se conseguiremos fazer a cirurgia endoanal". Ele nem precisou me explicar os dois procedimentos, porque eu já sabia de trás para frente todos os tratamentos possíveis e quando ele falou em colostomia, eu chorei muuuito. Meu filho, por estar com 7 meses na época, já não era mais um bebê e talvez não conseguisse realizar pelo método endoanal. E desse dia em diante rezava todos os dias até a data da cirurgia, principalmente quando fazia as lavativas em casa. Tinha que esvaziar o intestino dele, mecanicamente, de hora em hora. Ele chorava e eu também, pela dor que imaginava que ele sentia.

Até que enfim chegou o dia da cirurgia. Eu me despedi dele, ainda acordado, na entrada do centro cirúrgico e foi esse o dia mais angustiante da minha vida. Não digo o pior, porque meu filho saiu de lá curado. Mas a sensação é como se eu tirasse meu coração e entregasse nas mãos de pessoas estranhas, sem saber se cuidariam dele corretamente. E depois de tantos erros e diagnósticos não dados, a gente fica meio desconfiada.

Depois de algumas horas, a notícia de que a cirurgia foi um sucesso, não havia sido feita a colostomia e que haviam retirado 20 cm do intestino dele (na verdade a parte sem gânglios era de pouquíssimos centímetros, só final do reto, mas por conta do atraso no diagnóstico, a parte sadia começou a ser comprometida, ficou dilatada pelo esforço fora do normal para evacuar e as infecções que se instalaram).

Em casa, uma nova etapa, do dia para a noite, assaduras terríveis, porque suas fezes estavam ácidas, o intestino começou a funcionar rápido demais, já que o trânsito intestinal ficou mais rápido, e também em razão dos antibióticos que ele estava tomando. Eram 20 a 24 fraldas por dia. Até normalizar (e acreditem, vai normalizar, por mais que pareça uma eternidade, foram lutas diárias, tubos de pomadas de todo o tipo, caríssimas até maisena com uma receita caseira da vovó - e deu certo! Muito certo). Hoje, com 1 ano e 3 meses, meu filho está curado, sem restrição alguma alimentar, seu intestino funciona normalmente (ele é até um pouco solto, às vezes tenho que dar comida para prender) e contamos nossa história para que outras pessoas que estejam passando por isso saibam que no final, vai dar certo. Não percam a esperança e sejam fortes, porque essa vai ser apenas uma história para relembrar.

Renata Ricardo